O MIOLO DA MISSIVA
Seja bem-vindo! Os textos publicados são inspirados na linguagem pictórica não-verbal do Tarô. "O baralho de Marselha nos chega desacompanhado de um texto explicativo. Em vez disso, oferece-nos simplesmente uma história pela imagem, uma canção sem palavras, que nos acode ao espírito como um velho refrão, evocando lembranças sepultadas" (Sallie Nichols). Textos: Adriana Azenha. Fotos: Viviane Fracari. O Blog deu origem ao espetáculo teatral O MIOLO DA MISSIVA.
sábado, 3 de janeiro de 2015
PAPISA
Escrever mulher ou palavra.
Escrever mulher é como escrever toalha.
Escrever palavra é como escrever trevo.
Toalha molhada sobre a cama.
Trevo de quatro folhas não é trevo, é coisa sem nome.
Toalha de mesa molhada de vinho derramado.
Trevo desfolhado.
Palavra atrevida.
Entrevero de palavras é inspiração.
Mulher é palavra pouca como toalha para secar o mar.
Mulher é palavra entrevada.
Quero uma palavra espaçosa para escrever toalha de mesa para a santa ceia e seus treze homens sentados.
Quero uma palavra grandiosa para escrever palavra sem nome, palavra que não significa nada depois de desfolhada. Era trevo, depois virou folha, depois poeira na estrada.
Num trevo da estrada não tem a quarta via, encruzilhada, palavra robusta.
Encruzilhada é mais mulher na palavra.
Arbusto de trevos é dicionário para tudo que não tem significado.
Busto robusto.
Trevo entrevado.
Mulherada.
Muralha.
Para escrever mulher com quatro folhas, dedico uma folha para o seio direito, uma para o seio esquerdo, uma para as nádegas e outra para a buceta.
Podia escolher outra palavra para o destino desta quarta e última folha.
A folha que não é do trevo, mas que é da encruzilhada.
Para escrever mulher me dispo da palavra.
Para escrever palavra livro-me da folha.
Arranco do livro as folhas.
sábado, 28 de dezembro de 2013
A CARTA DA CASA | "Lupus est homo homini non homo" (Plauto).
Para HOMENS.
Inspirado na sequência: A FORÇA - O
DIABO - A PAPISA - A JUSTIÇA.
O homem é o lobo do próprio homem.
E se um homem quer o que o outro homem
também quer,
lobos brigam,
lobos sangram,
lobos morrem.
E o desejo permanece faminto.
Mais tarde além de querer, ele descobre
que tem poder.
Ele se apodera da coisa desejada, na
força, na marra.
E se ele pode, ele compra a coisa, ele
paga.
O outro lobo, quando pode menos, lambe os beiços, chupa o dedo e come lentamente a si mesmo.
Dê ao lobo o que lhe é de direito.
O lobo no homem divide o conteúdo do
pote.
O lobo no homem é o homem.
Ensina teu lobo a pensar.
Ensina teu homem a farejar, rastrear,
atacar.
Bota teu lobo pra estudar, ler,
pesquisar.
Bota teu homem pra urinar nos cantos,
demarcando terreno, protegendo a cria, alimentado a matilha.
O homem dorme na cama.
O lobo na cama não consegue dormir.
Deixa dar meia-noite pro lobo ser todo
o homem.
Lua cheia. Cheio.
Lobisomem.
Deixe que ele uive madrugada adentro.
Para que o homem desperte leve, para
que não pese mais que uma pena, seu puro coração.
Com amor
Adriana Azenha
sábado, 16 de novembro de 2013
A CARTA DA CASA | Brigar de Brincar.
Foram colocados de costas um para outro.
Um duelo.
As armas, apesar de diferentes, eram equivalentes.
Difícil saber se algum dos lados poderia levar vantagem.
Agir pela lógica.
Agir por instinto.
Qualquer das ações tinha um potencial de vitória.
Um ataque planejado ou um ataque impulsivo.
Um duelo estratégico ou um duelo imprevisível.
Na plateia, a torcida dividida, se divertia.
Bons de briga, quem morreria?
Uma facada no estômago.
Um pescoço estrangulado.
O juiz ergue o braço.
Duelo iniciado.
Oito passos para cada lado.
E frente a frente, abandonaram as armas e correram para
o abraço.
Desarmados.
Cada lado.
Quero vivo este lado para construir os muros.
Quero vivo este lado para pular os muros.
Constrói em mim.
Pula comigo.
FIM.
Inspirado na sequência:
A Justiça - O Imperador - A Força - O Sol.
Um duelo.
As armas, apesar de diferentes, eram equivalentes.
Difícil saber se algum dos lados poderia levar vantagem.
Agir pela lógica.
Agir por instinto.
Qualquer das ações tinha um potencial de vitória.
Um ataque planejado ou um ataque impulsivo.
Um duelo estratégico ou um duelo imprevisível.
Na plateia, a torcida dividida, se divertia.
Bons de briga, quem morreria?
Uma facada no estômago.
Um pescoço estrangulado.
O juiz ergue o braço.
Duelo iniciado.
Oito passos para cada lado.
E frente a frente, abandonaram as armas e correram para
o abraço.
Desarmados.
Cada lado.
Quero vivo este lado para construir os muros.
Quero vivo este lado para pular os muros.
Constrói em mim.
Pula comigo.
FIM.
Foto Viviane Fracari |
Inspirado na sequência:
A Justiça - O Imperador - A Força - O Sol.
domingo, 13 de outubro de 2013
A CARTA DA CASA | Sacola de Praia
Para: Elisandra Mariko Takamine
Inspirado na Sequência: O SOL - A MORTE - A JUSTIÇA - O LOUCO
Foto: Viviane Fracari |
Já passava do meio-dia...
O filtro solar não dava para dois.
Então passei um pouco nas costas do outro para proteger.
E o outro passou um pouco em meu peito para me proteger.
Minhas costas expostas.
Teu peito exposto.
Mais tarde as costas queimadas.
Mais tarde o peito ardendo.
Mais tarde o incômodo, a dor, o desconforto.
Pele morta.
...
Pele nova nas minhas costas.
Pele nova no teu peito.
Pensei dividir o quanto tinha, pensei que assim melhor seria.
Pensei não ser egoísta: protegendo-me inteira e te expondo a dor.
O que pensei pouco importou.
Nas minhas costas crescem asas.
No teu peito nascem espinhos.
Com as asas vôo para outras praias.
O sol sempre vai arder.
Na minha sacola tem óculos escuro, água, chapéu, e uma bisnaga de
filtro solar novinha.
Eu já sabia o que levar na minha sacola.
Visitei muitas praias, já ardi debaixo de muito sol.
Não posso prever a sacola do outro, não posso.
Quanto mais desprevenida do outro estou, mais longe posso chegar.
Arranca com uma pinça os espinhos do teu peito e antes de seguir
por outras praias prepara tua sacola.
Pode ser que a praia esteja deserta e que não encontres ninguém
para dividir contigo proteção.
Com Amor,
Adriana Azenha.
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