Foto de Viviane Fracari |
Vamos desabotoar a camisa?
Vamos deixar o
corpo nu?
A camisa é
colorida e o corpo neste momento é preto.
Uma ausência de
cor.
Um corpo preto
apoiado no solo, como um prego aguardando o martelo.
O tempo foi
suficiente para que o corpo revelasse o segredo escondido.
O corpo segurava,
com as mãos para trás, o segredo.
"Adivinha o
que eu tenho nas mãos?"
Um buquê de flores
ou um rato?
Um anel ou um pão embolorado?
Um chocolate ou uma pedra?
Um brinquedo ou um crucifixo?
Um lenço ou uma corda?
Adivinha! Você é ou não é uma menina espertinha?
O corpo estava de mãos
vazias, desde muito tempo... E a menina sabia.
Fez-se de ingênua
e jogou o jogo, arriscou um palpite e disse:
"Um pássaro!
Tens um pássaro escondido."
O corpo encerrou o
assunto. Disse a ela que não tinha um pássaro, mas sim uma arapuca.
Uma arapuca vazia
de pássaro, uma arapuca na expectativa do pássaro, uma arapuca que no vazio de
sua existência, que sem pássaro, é apenas espaço vago. E que com pássaro, é
arapuca preenchida da esperançosa liberdade.
"Quer a arapuca
para ter o pássaro?"
A menina começou a
chorar, não gostou da surpresa, guardou a arapuca, aceitou o presente, mas
jamais capturou o pássaro. Jamais quis preencher o vazio das mãos do corpo com
o interrompido vôo do pássaro.
De um lado a
esperança. E do outro?
A arapuca
desarmada era uma pirâmide de madeira inacabada.
Uma pirâmide sem
faraó.
Desmontou a
arapuca e refez a estrutura.
Nunca mais
arapuca, nunca mais gaiola, nunca mais sarcófago de faraó em pirâmide alguma.
Nada de túmulo
para vivas almas.
Nada de mãos que
de tão vazias clamam por preenchimento se valendo do vôo alheio.
Refez a estrutura.
No lugar de
arapuca agora se pode ver um cesto, um ninho, um berço.
Cada ripa de
madeira transformada em fruteira.
Seja pra ovo,
fruto ou feto.
O corpo tem que
estar com mãos preenchidas de mundo.
Infinito mundo.
O corpo estava
vestido com todas as cores. Vestiu-se de branco e saiu rodopiando.
(participam deste texto: O Enforcado, A Justiça, O Mago e O Mundo).
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